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  1. #1
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    Olhando o Mundo - Relatos portugueses

    Vamos iniciar a acompanhar a caminhada de dois novos amigos portugueses, que resolveram conhecer e desbravar este continente americano em toda a extensão. Sem dependerem de moto, pretendem utilizar os mais diversos meios para fazer esta travessia. Por isso, bastante interessante toda a percepção. A saída de Portugal de João e Alexandre foi após os festejos natalinos, no dia 26 de dezembro. Vamos acompanhá-los, então, já que pretendem, um dia, alcançarem o título de Grandes Caciques Fazedores de Chuva. Os relatos são retirados do sitio próprio que mantém, em http://www.olhandopelomundo.com/ .

    Partida do Largo de S. João - Alcochete

    Chegou finalmente o dia da partida.

    Por volta do meio dia fomos recebido na CMA pelo presidente Dr. Luís Franco e vereadores Dr. Paulo Machado e Sr. Jorge Giro.



    Tínhamos também os Médicos do Mundo (Paulo) e muitos amigos, conhecidos e desconhecidos, a despedir-se de nós.

    Feitos os discursos da praxe e bebido o Moscatel de honra seguiu-se a sessão fotográfica. Desta vez estávamos do lado contrário da câmera.

    Foram-nos oferecidos 2 polares e 2 blusões (com os logos dos patrocinadores), bem como duas bandeiras da Vila de Alcochete que irão representar o município e ficar gravadas em todas as fotografias que tiraremos em locais património da UNESCO.

    Obrigado a todos. E até breve!

  2. #2
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    sexta-feira, 30 de Dezembro de 2011

    Dançando em Buenos Aires



    Não estamos na capital da Argentina, estamos numa sala de baile com 14 milhões de dançarinos, embora muito poucos o sejam no sentido coreográfico do termo, mas o ambiente sentido faz-nos dançar, é como se algo dentro de nós despertasse, e o nosso corpo fosse levado pela sensualidade de movimentos e jogos de sedução, sentimentos estes, só possíveis em Buenos Aires (Mi Buenos Aires querido - Carlos Gardel).

    Na esplanada onde nos encontramos, com a vista do Puerto Madero na nossa frente, uma jovem loura vestindo de negro e de chapéu, versos Carlos Gardel, serve-nos um café.

    Perdendo-nos pelas avenidas na descoberta da cidade, encontramos no pavimento lajes com letras de tangos famosos, conhecidos de várias gerações.

    Num jardim, onde nos sentamos para descansar, um par a troco de umas moedas dança milongas, versão mais rápida do tango, com movimentos muito sincronizados e algo eróticos.

    Mais à frente, em La Boca, uma jovem vestida a preceito, convida o turista ou passeante a fazer com ela um passo de tango, posando para a foto testemunhando a passagem por estas terras.

    A nossa aventura começou, tal como o tango, em BUENOS AIRES.....

  3. #3
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    terça-feira, 3 de Janeiro de 2012

    "Qualquer um pode fazer, porém, poucos o fazem..."


    Chegámos ao “Fim do Mundo” no início do ano e no dia em que entra em vigor o acordo ortográfico com o Brasil. Sendo assim decidimos entrar também – virtualmente – para o grupo brasileiro denominado “Fazedores de Chuva”. Para fazer parte deste restrito grupo é necessário ter mota e já ter atravessado o continente Americano, desde Ushuaia, até ao extremo boreal norte-americano, no Alasca. A Angela e o Dolor da Silva fazem parte e é com eles que saímos de mais uma visita ao Museu “Antigua Casa de Gobierno”.

    Ushuaia tem quatro museus, todos eles contam a recente (para nós portugueses, pois para eles duzentos anos é muito antigo) história do nascimento da cidade, desde a instalação do presídio militar até à recente vaga de expedições antárticas. É impressionante ver a força e coragem que tinham os habitantes (alguns presidiários) desta terra para erigir construções como o presídio e montar uma linha de comboio para ir buscar lenha à floresta (agora Parque Nacional Tierra del Fuego). O Comboio do Fim do Mundo (ou Comboio do Presídio) entra pelo parque adentro e mostra uma beleza estrema mas também alguma desolação como o cemitério das árvores – restos de troncos cortados – os curtos, cortados no verão, e os maiores, cortados no inverno....no meio da neve.

    A Argentina, e o fim do Mundo não é exceção, está repleta pessoas a falar português segundo o novo acordo ortográfico. É perto e relativamente barato vir do Brasil para sul, agora de Portugal é mais raro. Mas tal não impediu a Ana, natural de Coimbra e viajante mundial, de se aventurar por estas bandas austrais sozinha! Conhecemo-la através de David, o dono da nossa “hosteria” que, assim que sabe que somos portugueses, nos diz logo que está cá mais uma. Não passam 5 minutos e aparecem os dois à nossa porta!

    A Ana, que já cá está há dois dias, acompanha-nos ao almoço e mostra que o mundo é seguro para se viajar sozinho...mesmo sendo uma mulher, pois a lista de países que já visitou o mostra. É verão, e apesar do frio, muitos andam de manga curta e calções. Nós não conseguimos. Separámo-nos e visitamos partes diferentes da cidade. Para “Fim do Mundo” estamos muito bem! Grandes avenidas, muitas lojas de marca, navio de cruzeiro atracado na doca! É nesta doca que apanhamos Elisabete, o barco que nos leva a visitar o canal Beagle (nome dado em honra do barco comandado pelo capitão Robert FitzRoy e que tinha como companhia Charles Darwin) e circundamos o desativado farol Les Eclaireus....a mil quilómetros da Antártida.

    Mil quilómetros da Antártida e quatro mil quilómetros do Pólo Sul! Estamos mesmo no “Fim do Mundo”, mas no início da nossa subida. Será que chegaremos a ser uns “Fazedores de Chuva”... sem mota? O Alasca o dirá.

  4. #4
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    Experiência de vida
    domingo, 8 de Janeiro de 2012



    Dei por mim a pensar – “Porque é que estamos a viajar duas pessoas que aparentemente não têm nada em comum?”

    Eu, filho de pai operário e mãe doméstica, ambos analfabetos (minha mãe fez a 4ª classe aos 72 anos). Comecei a trabalhar criança, com 10 anos, executando várias tarefas até que me fixei na metalurgia aos 16 anos. Profissões: fresador mecânico, desempregado, cooperante, vendedor, formador profissional. Situações extremas de vida levaram-me a que me tornasse empresário. Aos 65 anos concluo o ensino secundário. Compro casa em Alcochete, no prédio em que o João residia e, na condição de vizinhos, aproximamo-nos. Tenho 67 anos.

    O João é filho de pai engenheiro e mãe formada em germânicas. É licenciado em engenharia com pós graduação em ecoturismo. Trabalhou em multi-nacionais e PME´s, acabando por criar a sua empresa. Tem 39 anos (a idade do meu filho). O pai do João se fosse vivo teria a minha idade (algo em comum).

    O que nos aproximou? Gostar de viajar, fotografar, contactar com outras realidades, cultivar amizades, em suma viver e partilhar a vida.

    Fizemos duas viagens com outros companheiros, uma ao Reino do Mustang no Nepal e outra à Índia. Durante estes anos temos convivido e tornámo-nos amigos, argumento fundamental para nos lançarmos neste projecto.

    Estamos a terminar a segunda semana de viagem. Uma infinidade de enormes questões e pequenas coisas se põem entre nós todos os dias. Algumas de resolução simples, outras mais complicada, mas que requerem: humildade, bom senso, entre ajuda, decisão, energia partilhada, ceder espaço, momento de privacidade com alguém muito intimo, puxar pelo outro num momento de fraqueza. Não é fácil um empreendimento destes. Mas se conseguirmos, como acredito, levaremos até ao fim esta viagem pelo Continente Americano. Mas em simultâneo faremos outra, essa mais importante, porque é uma viagem ao interior de nós.

    E de pessoas que tinham pouco em comum terminaremos mais enriquecidos como seres humanos e mais próximos.

    Nota: Foto de hoje no Glaciar Perito Moreno

  5. #5
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    Rotas míticas, estradas de “rípio, dores de costas… e …
    15 de janeiro



    A Argentina e o Chile mereciam só por si uma viagem. Melhor, cada um deles merece uma viagem! Mas como não é esse o nosso propósito, a Argentina e o Chile vistos até ao momento resumem-se à Terra do fogo e à Patagónia! E isso sim, também é uma viagem!


    Se quisermos fazer rotas míticas temos duas nestes países. Na Argentina a “Ruta 40” que liga o norte ao sul do país por mais de 5000 quilómetros desde La Quiaca até Cabo Vírgenes. No Chile a “Carretera Austral” que liga a cidade de Puerto Montt à vila de O´Higgins numa extensão de 1240 quilómetros.

    Não fizemos nenhuma por completo, mas fizemos um pouco de cada uma. E apesar de cada uma ser no seu pais, têm muitas coisas em comum. A paisagem é deslumbrante, as horas que passamos dentro do autocarro são muitas, o piso varia entre asfaltado e “rípio” (terra batida mais pedras, o nosso macadame), e o resultado é o mesmo...dor de costas!


    É impossível querer ver o pais e não o fazer desta forma. Se entrarmos num avião perde-se muito da paisagem, muito das pessoas que encontramos nos pontos de paragem, parte das conversas com outros viajantes que fazem o mesmo, ou em sentido inverso, parte das recomendações para ir ver locais especiais. Foi isso que aconteceu connosco ao conhecermos a Lorena e a Alejandra. Argentinas de Buenos Aires que se cruzaram connosco pela primeira vez à entrada do autocarro em Rio Grande. Daí e por mais 4 cidades e outros tantos autocarro fomos nos encontrando, falando, ajudando (elas com a marcação de hotéis, nós com a subida ao Monte Fitz Roy). E foi através delas que soubemos da existência da Cueva de las Manos, sítio arqueológico classificado pela Unesco como património da Humanidade. Impressas em rocha estão “mãos” que datam de 9300 até1200 anos atrás. Impressionante o estado de conservação (aparte de uns quantos vandalismos).


    Chega a altura de nos separarmos, nós seguimos viagem para o Chile e elas regressam ao lado do Atlântico. Combinamos um jantar de despedida, tiramos a foto da praxe, trocamos emails e agradecemos mutuamente a ajuda. “Obrigado, sem vocês não teríamos conseguido subir ao Monte Fitz Roy” dizem elas. E nós teríamos subido se não tivesse sido preciso puxar por elas?


    As viagens são assim, e todos os países do mundo merecem ser vistos, pois têm uma coisa para além da paisagem e da comida.....pessoas.


    Mais informação sobre as rotas em:

    www.carreteraustral.net e

    www.turismo.gov.ar/esp/atra/ruta/mruta.htm


    João

  6. #6
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    Encontro com o poeta.
    19 de janeiro



    Ao entrar na casa museu de Pablo Neruda, na Isla Negra, a minha memória é assaltada por pesadelos e dores antigas. “Chove em Santiago” e choveu durante dias, meses e anos. Não vou falar dessas dores, vou falar de hoje, do que senti quando visitei a sua “Casa Museu”.


    Confesso que estou vivendo uma emoção muito forte ao entrar neste espaço. Venham comigo.


    Casa pequena quando a comprou em 1938, “...foi crescendo, como as pessoas e as árvores...”, tinha a seus pés o “oceano pacífico, não cabendo no mapa, por ser tão desordenado e azul, e não havendo espaço para ele o puseram em frente há janela da sua casa”.


    A decoração evoca o mar, a terra, onde nasceu, a amizade, o espaço para estar com amigos, a cozinha (espaço quase secreto, donde saiam os argumentos que cultivavam os afectos à mesa), os bordados feitos pelas mulheres do lugar Las Gaviotas rebaptizado de Ilha Negra pelo poeta e ainda a colecção de conchas. Os sinos existentes no jardim que ele tocava avisando os vizinhos da sua chegada.


    Em Temuco, cidade onde passou a infância, havia uma loja de arreios que tinha um cavalo em tamanho real. Neruda com 6 anos dizia ao dono: “Quero comprar o cavalo”. Muitos anos depois sabendo de vicissitudes da loja e do dono, adquiri-o, realizando o seu sonho de infância. Todo o ser humano que não mata a criança que há em si, como ele sempre fez, é especial.


    Poeta que escreve odes ao congro, à alcachofra e ao vinho, é um ser humano de excepção, narrando as coisas simples e belas da vida, essas sim, geradoras da felicidade.


    Neste espaço e tempo que privei com o poeta, emocionei-me e senti-me criança, porque hoje já não “Chove em Santiago”



    Así cada mañana

    De mi vida

    Traigo del sueño

    Otro sueño



    PABLO NERUDA




    Mais informações sobre a fundação:

    http://fundacionneruda.org/


    Alexandre

  7. #7
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    A Artéria Aorta Americana!
    domingo, 29 de Janeiro de 2012

    Já vos falei de estradas míticas uma vez, e sem querer parecer repetitivo vou falar novamente de uma, da “Senhora” estrada deste continente – A Pan-americana. Esta estrada com cerca de 48.000 quilómetros começa a sul no Chile em Quellón, ilha de Chiloé e vai até Fairbanks no Alasca. Tal como dizem os andes ser a coluna vertebral do continente sul americano, eu digo que a Pan-americana vai ser a nossa artéria aorta até ao destino final – Alasca.



    Pisámos pela primeira vez o seu alcatrão, uns quilómetros atrás, na cidade de Quellón, património da Unesco, tal como toda a Ilha de Chiloé, devido às suas igrejas de madeira. Ficámos uns dias em Castro, capital da ilha, e percorremos as redondezas à procura de tais monumentos. São vários e lindos, uns quantos a necessitar de verbas para restauro.

    Para se continuar na Pan-americana e chegar a Puerto Montt tivemos de apanhar um ferry e abandonar a ilha. O autocarro até parecia que conhecia o caminho sozinho e entrou nos braços bem aberto e metálicos deste gigantesco monstro dos mares. Minutos depois esperávamos o continente e a Pan-americana.

    Chegámos a Puerto Montt.... e nada mais do que um porto achámos ser. Feio, barulhento e triste corre connosco de novo para a estrada. Desta vez, e para termos algo de novo, um autocarro cama que demorou 12 horas a percorrer 1020 quilómetros até Santiago do Chile. Para quem nunca tinha tido este tipo de experiência foi óptimo porque saímos perto das 21 horas, dormimos e no outro dia de manhã estávamos na capital do Chile. A Pan-americana tinha-se revelado à altura das expectativas...foi pena foi não termos visto muita paisagem!

    Os dias em Santiago do Chile foram calmos e citadinos. Para alem da crónica anterior do Alexandre sobre Isla Negra, visitámos ainda Valparaíso, património da Unesco pelo seu centro histórico com casas do século XIX, percorremos as ruas e cerros de Santiago. Cerro Santa Lúcia, bem perto do nosso Hostal Santa Lucia e Cerro San Cristobal onde subimos de funicular e descemos pelo percurso pedonal no meio da vegetação. Almoçámos no Mercado Central, no meio de apregoadores de peixe e marisco, visitámos a Plaza de Armas com os seus cartonistas e jogadores de xadrez e vimos azulejos portugueses, doados pelo Metro de Lisboa ao Metro de Santiago, agora colocados na estação de Santa Lúcia.

    Santiago tinha muito mais para nos dar, mas a Pan-americana estava à nossa espera. E outro autocarro, desta vez semi-cama (pois a cama estava esgotada) levou-nos até Antofagasta percorrendo mais 1377 quilómetros dos seus canais, os últimos dos quais já no deserto. Pouco se pode dizer desta cidade, dum lado o oceano pacífico do outro um monte que a separa do deserto, o deserto do Atacama, o mais árido do mundo, onde não chove há séculos!

    Deserto para onde iríamos. Deixámos a Pan-americana por uns dias e rumámos ao deserto, a San Pedro do Atacama. Cidade oásis, de preços elevados e onde abundam muitos turistas foi nossa casa por três dias de modo a visitarmos o Valle de la Luna, o Valle de la Muerte (deveria ser Marte mas os Chilenos confundiram o fonema), o Géiser do Tatio, o Salar de Atacama com os seus flamingos e as Lagunas Altiplanicas. Foi nesta altura também que começamos a subir. Atacama está 2400 metros acima do nível do mar e os passeios que fizemos levaram-nos aos 4200 metros. Seriam um bom aquecimento para os dias que se seguiriam pois a travessia para a Bolívia seria um teste à nossa resistência e ao “mal de altitude”. Mas disso falará o Alexandre na próxima crónica.

    Eu apenas vos posso dizer que não esqueci a Pan-americana e ela não se vai esquecer de nós pois ainda teremos muito tempo para por a conversa em dia....mas só no Peru nos voltaremos a encontrar.

    Até já.

    Mais informação sobre a Pan-americana e o Património da Unesco:

    http://pt.wikipedia.org/wiki/Rodovia_Pan-americana

    http://whc.unesco.org/en/list

  8. #8
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    Enquanto ainda aguardamos algum texto da dupla João e Alexandre, que está na Bolívia neste momento, podemos ver algumas fotos que estão no site deles. Apenas para dar água na boca, já que fazem um trabalho fantástico.



  9. #9
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    Salto em altura ou salto das alturas?

    Parece que só me calha a mim falar de estradas...mas já lá vou!

    Vou começar por mais um recorde. La Paz é a capital recordista de “salto em altura”. Com 3600m é a capital mais alta do planeta. Nela habitam cerca de um milhão de habitantes, de várias etnias, não fosse a Bolívia um estado plurinacional desde a sua última mudança de constituição o ano passado. Encontra-se afundada no meio de um vale entre La Cumbre com 4670m e El Alto com 4100m. Esta última, cidade à poucos anos, têm tantos habitantes como La Paz e serve de artéria principal de entrada para a capital. Na descida para o centro podemos ver casas e mais casas por acabar, dando ideia de uma favela, mas mostrando uma realidade de casas em construção...há anos. O transito, as buzinadelas, as vendedoras de rua e o fumo a juntar à altitude fazem com que se esteja um dia ou dois para se habituar a tudo.



    Outro atrativo, principalmente para os amantes de downhill (descidas de bicicleta), é a desactivada estrada mais perigosa do mundo, também conhecida como estrada da morte ou estrada dos Yungas. Como não nos sentíamos capazes de a fazer de bicicleta, alugámos um táxi que nos levou pelas suas curvas apertadas, estreita largura (algumas vezes apenas 3,2m para os dois sentidos) e ravinas de 800 metros. A maior aventura para nós foi fazê-la no táxi de Don Elias, um carro velho, com os pneus traseiros carecas, sem pára-choques e com a 2º mudança sempre a saltar. Nesta estrada morreram centenas de pessoas nos últimos anos até ser construída a nova, inaugurada no ano de 2007. Agora só lá ficam alguns turistas incautos que exageram na velocidade ou contratam uma empresa que tenha bicicletas com falta de manutenção...ou travões! Mas chegámos salvos a Coroico, depois de 61 quilómetros e 3500 m de desnível, pudemos desfrutar do almoço e do clima tropical dos 1500m. A paisagem aqui é de floresta, verde e com pássaros a cantar. “Será que já estamos na Costa Rica?”- Pensámos nós, mas não, havia que voltar a subir para La Paz, desta vez pela estrada nova, com menos aventura.


    Aventura também é andar pelas “calles” desta capital. De táxi, a 4 bolivianos a corrida ou mini bus, a 1 boliviano (1€=8,8bolivianos), para nos misturarmos com a gente local, todas as ruas, igrejas, museus ou miradores merecem ser vistos, fotografados e recordados. Realçamos o museu nacional de etnografia e folclore, pelo seu espólio de tecidos e máscaras e o mirador Killi Killi com uma vista 360 sobre a cidade donde podemos perceber a sua geografia e analisar a sua construção.


    Em reconstrução está Tiwanaku (Património da Unesco), sítio arqueológico que podemos fazer numa visita de um dia desde La Paz. Este local representa a cultura pré-colombiana que existiu antes dos Incas (1500ac a 1200dc) e que povoou todo o altiplano andino. Este povo que falava a língua aymara, uma das actuais línguas oficiais do pais (juntamente com o espanhol, o quechua, o guarani e mais 396) dispersou-se e deu origem a vários sub-povos. Neste local existiu uma população de 100.000 habitantes numa área que cobria cerca de 6 quilómetros quadrados. São ainda conhecidos pela sua escultura de megalíticos e pela cerâmica que se espalhou pelo norte do Chile e Argentina e pelo Peru.


    É verdade, ainda não me esqueci da Pan-americana e já estou mais perto de a alcançar...mais uns 2000 quilómetros!


    Até já.

    Mais informação sobre Tiwanaku e a estrada dos Yungas:

    http://en.wikipedia.org/wiki/Yungas_Road

    http://whc.unesco.org/pg.cfm?cid=31&id_site=567


    João

  10. #10
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    BOLÍVIA – Um encanto sofrido...
    em 03 de Fevereiro de 2012

    O pequeno autocarro vai percorrendo caminho de montanha. O Chile fica para trás, já faz parte das nossas memórias recentes, registadas nas nossas câmaras fotográficas, não permitindo assim lapsos ou omissões no livro a criar, relatando em imagens as nossas vivências. Estamos na terra de ninguém. A caixa metálica pomposamente chamada mini autocarro, atira-nos de um lado para outro, sem respeito pelos nossos doridos corpos. O caminho não permite conforto. Opções de uma certa forma de viajar.



    Paramos junto a um contentor. À volta, um amontoado de veículos 4x4, nalguns arrumam-se bagagens, pessoas movimentando-se com mochilas. Lugar clandestino de montanha? Espaço de contrabando? Movimentos suspeitos! Jovens de rostos imberbes e inocentes tendo como seus haveres uma mochila às costas, esperando entrar neste país, mas dependentes de alguém que tratará da sua entrada. Esses homens munidos de expedientes, nas suas expressões duras, reflectem a violência em que a vida nos pode transformar quando a sobrevivência é posta em causa. Aqui tudo se resolve com dólares, pesos ou bolivianos. O contentor é o posto fronteiriço onde dois funcionários, vão recebendo formulários preenchidos, não entendendo por vezes, mas necessário ver, carimbar e dar ordem para seguir. Um homem de semblante carregado que nos trouxe de San Pedro de Atacama, leva-nos até junto de um outro homem, já entrado na vida e na idade, apresentando-o como Don Pedro. Ele será o nosso motorista e guia, a quem ficaremos entregues durante três dias até terminar os seus serviços em Uyuni. Foram-nos apresentados dois casais, Um chileno, Carina e Filipe, outro argentino, Cecília e Mariano. Estes serão os novos companheiros de viagem. Começamos a nossa descoberta deste país pelo sul.

    Num Toyota Land Cruiser vamos rolando por trilhos, que não podemos chamar estradas, e estamos em altitudes entre os 4200 e os 4980 metros. As dificuldades respiratórias fazem sentir-se, mas os lugares que vão passando diante dos nossos olhos enchem-nos os sentidos de belo e mágico. Este encontro com o mais primário e profundo que a natureza nos presenteia, Laguna Blanca, Laguna Verde e Laguna Colorada com os seus flamingos andinos de tons rosa contrastando com a cor da lagoa, Vulcão Uturuncu, Montanha das cores e Géiser Sol da Manhã.

    Não encontro palavras nem descrição para o que vi. As formas, reflexos, uma miscelânea de cores, cheiros, confundindo-me os sentidos, deixando-me em estado de hipnose.

    Mais à frente o cemitério dos comboios. Como a tecnologia obsoleta pode transformar-se em algo que nos encanta e prende os nossos sentidos, levando-me a imortalizar com a minha câmara, outra tecnologia a quem presto a minha homenagem. Sendo um dos países mais pobres da América do Sul foi dos que me tocou profundamente. O Salar de Uyuni com os seus 12.000 quilómetros quadrados, no seu branco imaculado, os seus raios cristalinos transformam-nos, em arco-íris, irradiando todas as cores que quisermos imaginar.

    Mas a cidade de Potosi e a mina Cerro Rico, marcaram e trouxeram recordações de tempos passados, de relações de trabalho duras em que o termo, “comer o pão que o diabo amassou” entra na perfeição e assenta como luva. A exploração mineira é feita em moldes cooperativos, mas a sua produção é comprada por consórcios mineiros que estabelecem as cotações em mercado. Não vou abordar este tema porque a sua dimensão me transcende, embora o resultado seja sempre o mesmo. O poder subjuga o trabalho. Aquilo que vi, respirei e andei dentro das galerias que percorremos e descemos até ao 3º nível de profundidade, disse-me tudo. O equipamento com que trabalham as condições e os meios que dispõem para movimentar o minério lembrou-me a obra literária de Emile Zola - “Germinal”. São condições de escravatura. Saí revoltado e triste, senti vergonha dos meus queixumes, pelo transporte que nos foi amaçando os corpos, daqui a alguns dias no conforto e comodidade da minha vida esquecerei o desconforto do mini-bus. Mas o Rolando, agora guia, e seus companheiros trabalhadores da mina Cerro Rico, continuarão a viver e a trabalhar em condições que desrespeitam toda a condição de ser humano.

    Alexandre

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